29.10.12

o relógio é um ser sozinho

existem os relógios sincronizados e existem os relógios que não se comunicam.

ou você está, ou você não está.


não existe um quase, um meio, um talvez.


até parece que não existe o tempo da dúvida,

o tempo da falha.
o engano,
o olhar enevoado.

... às vezes, um dos relógios quebra.

seu funcionamento evade como névoa levada pelo vento,

o pó soprado em nossos olhos.

meu ponto referencial parou.

olhou para o outro lado,
não está.

não importa os porquês

não importam as baterias recarregadas,
já não caminham mais juntos.

existem tantos caminhos quanto existem relógios.


[mas não posso trocar o meu ponto referencial como quem troca a pilha]

a pilha é a ofensa a alma dos relógios.

...

qual a diferença dos relógios, se eles contam o mesmo tempo?


no mesmo passo,

a mesma busca.

importa a estrada.


o mesmo horizonte

o mesmo vento
os mesmos ruídos.
o mesmo cansaço
a mesma preguiça
a mesma raiva,
o mesmo ardor.
o mesmo calor
os mesmos olhos,
o mesmo tato.

a tatear a estrada invisível de tempo.


a tatear as distâncias e proximidades invisíveis de quem está lado a lado,

mirando o mesmo horizonte oásis.

23.10.12

re-amores

ou golden hour after storn

o melhor sol é aquele que vem depois da chuva.
tingindo o dia e o olhar de alegria.



14.10.12

o sono e a vigília

... as questões da diferença entre ficção/ciência, entre fantasia/verdade que são variantes do binômio sono/vigília... *

Fico pensando na invenção como algo próprio do sono/sonho.
e com isso...
o único modo de estar atento ao mundo, percebê-lo 
[observar-estar distanciado da invenção] 
é a vigília, o estado desperto.

o estado muito atento às emoções no universo externo particular.
[particular, mas no mundo].

se tenho sono, não observo.
vivo no deserto caminhante.
aquele que perde-se de todas as referências...
aquele que inventa, que cria,
mas que pode viver a delusion programed,
em loopings de viver, em redemoinhos de areia.

como inventar o despertador no deserto?
qual o som que toca para o vento cessar, e os olhos se abrirem de fim de nevoeiro?

nevoeiro dentro de si, mal enxerga o sol.
não enxerga os layers que atravessam as camadas de ser,
por entre as frestas,
do sono, do desejo, do conforto deep on the ground.

areia movediça.
mar repuxo-movediço.

os pés soterrados
os olhos fechados
a paisagem encerrada em névoa
o mundo inventado e real tão esmaecido

o despertador é o sol de fim do dia cinza,
aquele que chega rente aos olhos, invade as frestas
sedutor e incisivo.
mas um convite irregular.

regular deveria ser a vigília, que busca estar acordada com o dia,
e sempre esquece que existem as noites,
sempre adormece de repente,
e às vezes tem vontade de hibernar.

hibernar pesado como os ursos
ou as árvores seculares que caem quando as cortamos.

o peso da noite no olhar obscurece até a invenção,
o mundo que inventarmos-buscamos viver,
aquele cheio de alegrias, desperto como as articulações do relógio.
[a busca do ponteiro são as 12 horas].
e depois outro sol, outro trajeto, mudar como as dunas de areia.

aquele que abre os olhos não enxerga melhor.
[o seu horizonte de deserto nunca muda, ainda que caminhante]

aquele que abre os olhos enxerga onde está.
se eu não me mover, é o mundo que se move.
se eu me movo eu fixo o deserto como fixo o meu oásis.

o mar.

aquela eterna busca inventada, enquanto dormia, enquanto navega.


*texto de João A. Frayze-Pereira, em catálogo sobre obra de Grete Stern, IMS, 2009.

13.10.12

o deserto abandono

















* Fotografias de Álvaro Sánchez-Montañés da aldeia abandonada de Kolmanskop, Namíbia.

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o deserto invasor é cheio, é o preenchimento do abandono.
é o suave tempo das dúvidas, das incertezas, dos apagamentos.
o esquecimento.
...
o deserto é caminhante, e procura o desconhecido.